Nos textos reunidos no livro “Hermenêutica, arte e
técnica da interpretação”,Friedrich D.E.Schleiermacher expõe as limitações que
encontra na interpretação hermenêutica que se fazia até as três primeiras
décadas do século XIX. Ele critica filósofos e teólogos que seguiam o modelo
tradicional com regras de compreensão específicas para cada área do
conhecimento e propõe uma visão mais ampla desta arte interpretativa. Neste
sentido, reúne elementos comuns que fazem com que a hermenêutica contribua na compreensão das diversas obras sobre as quais é aplicada e, a partir daí,
começa a traçar seu conceito mais amplo e universal. Este conceito torna muito
mais extensa a tarefa da hermenêutica que não fica mais restrita às Sagradas
Escrituras, Clássicos da Antiguidade e textos jurídicos mas se estende por
obras de todos os estilos, períodos e alcances intelectuais, abarcando ainda as
conversações, discursos imediatos e obras não literárias.
O autor do livro delimita a área de atuação da
hermenêutica entre as situações em que haja pelo menos algo em comum entre o
intérprete e o autor da obra e, nesta, pelo menos algo de estranho que se
queira conhecer. Para levarmos o procedimento interpretativo adiante, ele nos
fornece algumas chaves que encontra nos hermeneutas de sua época e outras que
ele mesmo propõe no sentido de tornar a interpretação mais precisa e
totalizante. A proposta original de Schleiermacher é fazer com que a
interpretação contemple as características linguísticas gerais e individuais de
cada autor associadas ao exame psicológico mais profundo deste. Assim, o
resultado do trabalho pode evitar o pedantismo - comum aos que fazem análises e
comparações rebuscadas mas se esquecem do autor como um homem por inteiro -
além de reduzir o risco de atribuir ao autor intenções que ele nunca teve -
erro muito frequente entre os que conhecem bem o homem mas não têm domínio da
linguística.
Para Schleiermacher, as análises linguística e
psicológica devem ser perpassadas pelos métodos de compreensão
histórico-comparativo e intuitivo-divinatório. O primeiro se detém, por
exemplo, ao exame das particularidades de uma obra dentro do contexto mais
amplo das obras do mesmo gênero publicadas ao longo do tempo. O segundo
prescinde de uma demonstração científica mas requer do intérprete uma visão
abrangente de tudo o que envolve a obra - sua época, lugar, acontecimentos que
a influenciaram, personalidades do autor e de seus pares contemporâneos, etc –
para que o sentido mais amplo possível possa ser intuído como algo que alinhava
todos os aspectos do contexto e que poderia ser chamado o espírito vivo da
obra. Para o autor do livro, a adivinhação também se torna possível porque cada
um de nós é uma manifestação do viver total, o que quer dizer que todos têm em
si um mínimo de cada um dos demais e pode, por comparação consigo mesmo,
compreender o outro.
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