A
LINGUAGEM E O
OUTRO
1)Georges
Gusdorf considera a linguagem um patrimônio coletivo compartilhado
entre os homens. É dado a cada um de nós para dele fazermos uso como ponto de
encontro entre o eu e os outros. A linguagem torna-se, portanto, o instrumento
com o qual lançamos ao mundo nossa subjetividade, tornando-a objetiva por meio
de relações que estabelecemos entre as palavras conhecidas por todos. Claro que
o caminho inverso, do outro em direção ao eu, também se dá por meio da
linguagem comum. Sem ela, o eu e o outro jamais transcenderiam aos limites de
seus corpos, ficariam confinados a uma existência sem existencialidade por
faltar-lhes meios para a formulação e o compartilhar de sentidos para o
mundo.
Para a
compreensão do outro devo considerar a impossibilidade da comunicação plena
entre os seres humanos. A expressão mais autêntica de qualquer pessoa sempre
vai esbarrar nas limitações da
linguagem. Afinal, só mesmo se cada um de nós inventasse sua própria linguagem,
a subjetividade de cada ser humano poderia ser expressa com a maior exatidão
possível. No entanto, a multiplicidade ilimitada de linguagens pessoais ao
extremo, tornaria impossível a comunicação e não conseguiríamos atingir as
subjetividades um do outro. Não haveria um instrumento comum, dominado por
todos, que se referisse às coisas que precisamos comunicar para compreendermos
e sermos compreendidos. Permaneceríamos, então, na condição de
incomunicabilidade a que estão sujeitos os animais.
Para Gusdorf, a possibilidade de comunicação que é o que lança o homem para fora de si mesmo por saber que será ouvido e entendido (mesmo que não plenamente), é o que nos torna humanos por sermos, comunicativamente, capazes de compreender o outro e a nós mesmos por meio do diálogo, ainda que este diálogo seja interior (com outro que faço de mim, em mim) ou mesmo personificado na Natureza como um alter-ego, como fazem os poetas. Como diz Gusdorf, “a linguagem, desde a sua forma mais rudimentar, atesta uma procissão do ser pessoal no exterior de si próprio”.
Para Gusdorf, a possibilidade de comunicação que é o que lança o homem para fora de si mesmo por saber que será ouvido e entendido (mesmo que não plenamente), é o que nos torna humanos por sermos, comunicativamente, capazes de compreender o outro e a nós mesmos por meio do diálogo, ainda que este diálogo seja interior (com outro que faço de mim, em mim) ou mesmo personificado na Natureza como um alter-ego, como fazem os poetas. Como diz Gusdorf, “a linguagem, desde a sua forma mais rudimentar, atesta uma procissão do ser pessoal no exterior de si próprio”.
Isso quer
dizer que o outro é a condição de existência material e intelectual para cada
um de nós. Falo para me dirigir ao outro, para me fazer compreender. É no ato
de participação na linguagem comum que nos desenvolvemos como seres humanos
tornando-nos autônomos ao mesmo tempo em que envolvidos num empreendimento
comum a todos os homens. É por meio da linguagem que nos tornamos “senhores do
mundo”, significando-o à nossa maneira tornamos manifesta a soberania humana. A
palavra humana, com sua rede de significados, nos possibilita abstrairmo-nos da
situação momentânea. Permite que esta seja decomposta e perpetuada para que nos
distanciemos dela e, na distância e na ausência física das situações
condicionadas, tenhamos mais segurança nas análises e nas tomadas de decisões.
De acordo com Gusdorf, algo bem diferente se passa com os animais que, por não
conhecerem o signo, apenas reagem de forma condicionada às situações que se
lhes apresentam. Apenas aderem a uma presença concreta para que possam
satisfazer suas necessidades sendo movidos por sinais que se originam de
acontecimentos não dominados por eles. Comportamento que tem por única
finalidade a adaptação da espécie ao mundo e que são definidos por exigências
biológicas de seus organismos.
2) Para
Platão, o mundo das Ideias tem uma cópia de si na linguagem, porém não se trata
de uma cópia idêntica, mas sim composta por elementos que mantêm relações
análogas àquelas que representam, ou seja, análogas às relações entre os
princípios que regem o mundo da ideias. Esta
analogia é possível graças à correta proporção estabelecida entre os termos da
linguagem e os termos do mundo ideal. A
linguagem só consegue se referir ao mundo das ideias, eterno e imutável, porque
se constitui em uma representação proporcional deste. O Mito da Caverna nos
fornece um exemplo desta concepção platônica uma vez que, no mito, as sombras
que se projetam na parede da caverna não são as coisas mesmas que as originam
mas, como toda sombra, preservam as proporções dos objetos reais. Assim, o filósofo determina o status
ontológico da linguagem dentro de uma concepção do Não-Ser como Outro em
relação a uma ideia determinada, em vez de uma negação do Ser. As sombras
projetadas não são o Ser original mas são algo em si mesmas.
Intérpretes
da obra de Platão afirmam que, para o filósofo, a linguagem, além de
representar as ideias do mundo eterno também representa o mundo sensível
estabelecendo com este, da mesma forma que com o anterior, relações de
proporcionalidade. Por isso, a linguagem se constituiria em um intermediário
ontológico entre os dois mundos. Como na Matemática, aqui o termo intermediário
é o que nos fornece uma medida comum entre dois termos aparentemente opostos. É
ele quem une e aproxima os extremos de forma harmoniosa. Na linguagem, a
intermediação que obedece à proporcionalidade não tem números como termos mas
sim palavras, Ideias e o mundo sensível, ou seja, trata-se de uma analogia
simbólica e não numérica. Com sua capacidade harmônica, a linguagem consegue
ordenar o real, é capaz, portanto, de nos formar uma imagem da estrutura e dos
princípios que organizam o cosmos. Esta concepção nos faz perceber ainda que,
para Platão, a linguagem, apesar de ser uma invenção da imaginação humana, não
é uma invenção totalmente arbitrária porque reflete a criação artística do demiurgo,
mentor do mundo das ideias. Comentaristas de Platão concordam, no entanto, que
a linguagem tem uma capacidade limitada em demonstrar os princípios fixos,
eternos e imóveis que organizam e tornam o mundo inteligível.
Há pontos
coincidentes das teorias da linguagem de Platão e Aristóteles. Para este último,
a linguagem é capaz de penetrar no reino das coisas mesmas, extrair de lá as
relações recíprocas que elas mantêm umas com as outras e reproduzir estas
relações com o uso correto de nomes, verbos e as regras que os associam. Aristóteles
concorda que a linguagem faz referência ao real que fica além dela mesma e além
da Lógica. Portanto, assim como em Platão, em Aristóteles a linguagem mantém
com o ser uma identidade e uma diferença, um pertencimento ao ser sendo
distante dele. Por meio dela, o ser se torna uma ausência que está presente.
Neste sentido, as concepções dos dois filósofos vão de encontro à dos sofistas
que reconheciam na linguagem apenas a função persuasiva com a qual buscavam a
maior eficiência possível dos discursos. Em vez de considerarem a linguagem
como um caminho possível de aproximação com a verdade, os sofistas defendiam a teoria imanentista que afirma que
a linguagem não é capaz de nos remeter para algo além e distinto dela mesma. Aristóteles
considerou insuficiente a reação de seu mestre aos sofistas pois, para ele,
Platão apenas recorreu ao mito e tentou ridicularizar ou apontar
contradições entre eles mesmos, os
sofistas. Comentaristas contemporâneos afirmam que Platão encobriu a verdadeira
essência da linguagem ao sustentar que as ideias estariam acima das palavras. Ao
contrário de Platão, para quem a linguagem seria mímesis da criação do demiurgo, Aristóteles afirma que o
ser-no-mundo é quem possui a mímesis
criadora em seu horizonte. Paul Ricoeur afirma que a mimesis de
Aristóteles está na “verdade do
imaginário e no poder de detecção ontológica da poesia”.
Gostaria de saber quais as referências teóricas, por favor?
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